O que é o passado senão o caminho para o futuro?

Uma das expressões que mais reflecte a minha forma de ver a realidade é a seguinte: "Quem não conhece o seu passado não pode construir o seu futuro". A história, a experiência e vivência passada constituem a verdadeira sabedoria, na qual deve alicerçar-se a transformação da realidade, com vista ao progresso da humanidade. O passado histórico não é o nosso património colectivo mais importante, é nesse passado que vemos quem somos, de que somos feitos e do que somos capazes. Para o bem e para o mal. Contudo, não é olhar para o passado com pena do que passou, isso seria conservadorismo e passadismo. O que proponho é olharmos para o passado para enquadrarmos, contextualizarmos e compreendermos a necessidade de progredirmos, com os olhos postos no futuro. Da tese para a síntese. O passado e o presente são os únicos momentos do tempo que realmente possuímos. O futuro apenas o podemos construir, no presente, todos os dias que passam.

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Também foi assim, um dia...

"Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta.
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula,não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro.
Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País.
A justiça ao arbítrio da Política,torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.
Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar."
                Guerra Junqueiro, 1896.